Governo deve propor fim do fator previdenciário
O ministro da Previdência Social, Carlos Gabas, reacendeu ontem a discussão sobre o fim do fator previdenciário, o multiplicador criado em 1999 que encolhe o valor da aposentadoria no País. Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, Gabas defendeu a adoção do sistema 85/95 como ponto de partida para as negociações com trabalhadores. O objetivo é prolongar o tempo de contribuição a fim de diminuir o déficit da Previdência.
“O fator previdenciário é ruim porque não cumpre o papel de retardar as aposentadorias”, disse Gabas. “Nos últimos dez anos, a expectativa de sobrevida no Brasil subiu 4,6 anos. Em média, a expectativa de vida chega a 84 anos e a idade média de aposentadoria por tempo de contribuição é de 54 anos. Então, o cidadão fica 30 anos, em média, recebendo aposentadoria. Não há sistema que aguente”, declarou. Especialistas ouvidos pela FOLHA consideram a proposta melhor que o sistema atual, mas fazem ressalvas.
O conceito apresentado pelo ministro consiste em somar a idade do trabalhador ao seu tempo de contribuição, permitindo a aposentadoria quando o resultado for 85, para mulheres, e 95, para homens. Um homem com 55 anos de idade poderia se aposentar caso tivesse contribuído 40 anos. A proposta chegou a ser levantada no governo Lula, mas não prosperou. A advogada e presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário, Jane Berwanger, lembra que a proposta apresentada em anos anteriores mantinha a existência do fator para casos em que a soma 85/95 não se aplicasse.
“Nesse sentido, a proposta era boa; as centrais não vão aceitar se não houver essa possibilidade”, acredita Jane. Para ela, manter a possibilidade de aposentadoria por idade seria essencial como opção para aqueles que não conseguem se reposicionar no mercado de trabalho.
O fator previdenciário surge após um cálculo complexo, que inclui tempo de contribuição, expectativa de vida e média salarial. A Previdência oferece a tabela com o cálculo realizado para consulta em sua página na internet. Quanto mais novo o trabalhador, maior a perda salarial. Um homem de 50 anos que tenha contribuído 35 e atinja R$ 2 mil de média salarial, por exemplo, alcançaria uma contribuição inicial de apenas R$ 1.180. O advogado previdenciário Fernando Benedetti considera a proposta do ministro razoável.
“Quando o fator previdenciário incide sobre uma contribuição média de R$ 1 mil, ela cai para um salário mínimo; sem o fator não teria essa queda tão grande”, destaca. Com a nova regra, o advogado acredita que seria vantajoso trabalhar mais cinco anos a fim de evitar a perda de até 40% no benefício.
Sobre a possibilidade de estabelecimento de uma idade mínima para aposentadoria no País, nos moldes do que acontece na União Europeia, Benedetti é contra. Para ele, a ideia penaliza os trabalhadores mais humildes, que começaram a trabalhar muito jovens. Jane Berwanger também refuta a opção. “O mercado de trabalho para pessoas com mais de 50 anos é muito difícil; em períodos de crise eles são os primeiros a perder o emprego”, defende.
Atualmente, são pagos 18,1 milhões de aposentadorias no País. Mensalmente o gasto ultrapassa R$ 18 bilhões. A reportagem buscou mais detalhes sobre o projeto, mas a assessoria do Ministério da Previdência Social declarou que ele ainda não consta na pauta do governo. Segundo a assessoria, o foco no momento é discutir com as centrais sindicais e o Congresso Nacional o pacote de mudanças nos benefícios sociais.