Tecnologia e inovação são porta para a inclusão bancária
São Paulo – Os bancos precisam inovar o modelo de negócio e investir em tecnologia para ampliar a inclusão bancária. Atualmente, o Brasil tem cerca de 55 milhões de adultos não-bancarizados, que movimentam R$ 665 bilhões por ano. De acordo com o presidente do Data Popular, Renato Meirelles, os bancos estão viciados no atual modelo de negócio, que garante lucros há muito tempo.
“É questão de enxergar o potencial. Quando se ganha dinheiro do jeito tradicional, prefere não se arriscar em coisas novas”, diz, lembrando do caso dos private labels (cartões de crédito que só podiam ser usados em um determinado estabelecimento), onde os bancos não demonstraram interesse no início e, depois, após o avanço do negócio, correram atrás e começaram a adquirir essas empresas.
De acordo com o executivo, os bancos criaram modelos de negócios para o consumidor que movimenta vários produtos bancários e não conseguem pensar em algo de médio prazo. “Os correspondentes bancários são uma dessas iniciativas. Mas ainda é pouco. Muitos correspondentes foram criados para tirar o cliente da agência. É mais barato ter um correspondente do que manter uma agência”, diz.
Meirelles ressalta que tecnologia via celular e mobile é importante para a inclusão deste segmento. “O caminho para a inclusão financeira é, antes de tudo, o caminho tecnológico. É a porta de entrada das pessoas ao segmento financeiro”, avalia. De acordo com ele, os bancos precisam, primeiro, entender que os não-bancarizados movimentam cerca de R$ 655 bilhões por ano e que eles precisam de um atrativo para ir para este mercado. “É necessário que haja meio de pagamento que seja aceito nos lugares onde vivem”, diz, ressaltando que esse é um grande desafio para as adquirentes – empresas que fazem o meio de campo entre o lojista e o cartão. “É preciso ter investimento em tecnologia e repensar o modelo de negócio. Lembrar ainda que esse consumidor tem potencial, pois ele pode comprar seguro, título de capitalização, conta planejada, tem uma gama de oportunidades”, diz.
O chefe-adjunto de regulação do Banco Central, Mardilson Fernandes Queiroz, disse em evento em São Paulo, na semana passada, que o mercado precisa inovar com estratégias para alcançar essa população. “É preciso reinventar, inovar. São necessários novos padrões tecnológicos. O maior desafio para o mercado é conseguir que essa população compre o produto”, diz, ressaltando ainda que a principal porta de entrada deve ser a moeda eletrônica. “Não adianta entregar instrumento que ele vai usar para sacar, tem que ter um instrumento completo, que ele consiga gerenciar despesas e receitas no mesmo meio. E, se quiser sacar depois, saca. O cartão tem que ser a segunda ou terceira porta de entrada”, avalia.
Meirelles também concorda que o melhor é o indivíduo administrar o que tem. “Quanto mais calmo for o planejamento financeiro melhor. Isso não quer dizer que o crédito não é uma opção, sim, é, se ele precisar”, diz.
O presidente do Data Popular explica que hoje existem três grandes perfis de pessoas não-bancarizadas. O primeiro é formado pelos que estão fora do sistema financeiro por opção. “O banco não resolve o problema dele. Não tem e não quer ter. Por exemplo, num casal, apenas um tem conta o outro se utiliza de dinheiro”, diz. O segundo perfil é dos indivíduos que estão em lugares de difícil acesso, em zona rural e locais bem distantes. “Operacionalmente, não faz sentido ter uma agência bancária nesses lugares”. Já o terceiro perfil pode estar em qualquer lugar, é aquele indivíduo que tem o nome sujo e foi excluído do sistema.
A maior parte dos não-bancarizados são do sexo feminino e com idade entre 25 e 59 anos. Seis em cada 10 pessoas são negros, e 68% tem ensino fundamental ou menos.
O executivo observa ainda que a curva de inclusão financeira é ascendente e que todo ano o número de não-bancarizados cai, mas avalia que ainda vai demorar “bons anos” para zerar este segmento. “Os bancos têm interesse neste pessoal, mas estão perdidos, não sabem como atingir esse público”, diz. Segundo ele, o maior avanço na bancarização foi verificado com o aumento do emprego formal. “À medida que as pessoas são contratadas passam a receber salário em banco e vão entrando para este mundo”, diz. O executivo lembra ainda que o microcrédito é um importante instrumento de financiamento para este segmento, pois a maioria não trabalha com carteira assinada.
Sobre o cadastro positivo, Meirelles avalia que é importante, no entanto, pondera que precisa ser mais amplo. No modelo que foi concebido ele deixa de fora os entrantes e prejudica os mesmos com taxas de juros mais altas. “Só entram com meia verdade. Não é justo que bons pagadores paguem por maus pagadores e também não é justo que quem entra no sistema pague um juro mais alto. A ausência de memória financeira não pode prejudicar este cliente. Tem que haver mecanismos para proteger este consumidor”, diz, sugerindo, por exemplo, que o histórico do não-bancarizado seja feito a partir da conta do pré-pago, contas de água, luz, entre outras.