União usa receita extra para cobrir desonerações

Posted by Clayton Teles das Merces on 18 fevereiro 2014 in Sem categoria |

Desde 2008, quando o governo brasileiro começou a adotar desonerações tributárias para amortecer a queda da atividade econômica e, ao mesmo tempo, a participação de receitas extraordinárias ganhou peso na geração de superávits primários, o efeito líquido das duas rubricas só foi positivo para o resultado fiscal em 2010 e 2011, graças à capitalização da Petrobras e aos refinanciamentos da dívida tributária, mais conhecidos como Refis. Os cálculos são de Gabriel Leal de Barros, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), com a colaboração de Vilma da Conceição Pinto.

Na edição de fevereiro do Boletim Macro do Ibre, Barros estima que, nos últimos seis anos, o volume total de isenções fiscais e receitas não recorrentes foi semelhante, de R$ 193,4 bilhões e R$ 190,3 bilhões, respectivamente. Em sua avaliação, a convergência reforça a tese de que o governo vem buscando receitas compensatórias para fazer frente à perda de arrecadação decorrente dos estímulos fiscais, o que, junto a revisões para baixo das metas de superávit, gerou o atual quadro de desgaste da credibilidade das contas públicas.

Em 2013, segundo o pesquisador, o saldo líquido entre desonerações e receitas extraordinárias foi negativo em 0,3 ponto do Produto Interno Bruto (PIB) para o superávit primário, ano em que a proporção entre incentivos fiscais e o PIB atingiu o pico de 1,6%. No mesmo período, mesmo com a entrada no caixa do governo de R$ 21,8 bilhões do parcelamento de impostos devido aos descontos do Refis e de R$ 15 bilhões da venda do campo de Libra, no pré-sal, as receitas temporárias somaram menos em proporção do PIB do que as desonerações: 1,3%.

Para Barros, a estratégia de compensar o ritmo crescente de incentivos fiscais com recursos extras para sustentar superávits “não tão fracos” funcionou no começo, mas como, à exceção de 2009, as desonerações não se converteram em maior dinamismo da economia – e, portanto, não resultaram em alta da arrecadação – o abismo entre as despesas e receitas primárias se aprofundou. “Como o fôlego do governo para buscar receitas extraordinárias está cada vez menor, a pressão sobre o superávit primário, que já está muito baixo, cresce ainda mais”, disse.

Nas contas do economista, a proporção entre renúncias fiscais e o PIB será mantida em 1,6% neste ano. Ele projeta que R$ 85 bilhões deixarão de entrar nos cofres do governo em 2014, dos quais cerca de R$ 5 bilhões se devem somente ao “impacto cheio” da inclusão dos setores da construção civil e do comércio varejista na desoneração da folha de pagamentos. Esses dois ramos da economia entraram no novo regime de tributação durante o ano passado.

Barros afirma que a ampliação do benefício para mais de 50 segmentos mostra que falta uma avaliação sobre o impacto das desonerações em cada ramo. Em 2012, a desoneração da folha focava em setores que sofriam maior competição internacional e cujo custo da mão de obra afetava a competitividade, mas, ao longo do tempo, esse objetivo se perdeu. “Saímos da competitividade e fomos para outro ponto, que é garantir o nível de emprego. É preciso que o governo avalie qual o custo-benefício de continuar renovando esse subsídio para essa quantidade de setores.”

Ao mesmo tempo, destaca Barros, as fontes de receitas não recorrentes estão minguando, em função principalmente da redução de pagamentos de dividendos das estatais Petrobras e Eletrobras à União. Esse movimento tem sido compensado nos últimos anos por meio dos bancos públicos, mas o pesquisador pondera que a Caixa Econômica Federal e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) estão sujeitos a regras prudenciais, que restringem o pagamento continuado de remessas elevadas ao Tesouro Nacional.

Assim, sem uma revisão na composição do crescimento das despesas e da política de estímulos tributários, o pesquisador avalia que será bastante complicado o governo recompor sua capacidade de garantir resultados fiscais mais robustos no médio prazo. Segundo Barros, a sinalização da trajetória das contas públicas para além de 2014 é tão ou mais importante para recuperar a credibilidade da política fiscal do que o anúncio da meta de superávit para este ano, a ser feito nesta semana.

Para diminuir a pressão sobre o superávit primário também nos próximos anos, o especialista sugere que o governo reavalie, além da questão do salário mínimo, das pensões do INSS e dos cortes “diretos” de impostos, o que ele chama de “subsídios indiretos” – quando, por exemplo, o Tesouro Nacional faz empréstimos ao BNDES. “Isso é um gasto indireto que tem um custo fiscal, porque o Tesouro se endivida pela taxa Selic e recebe do BNDES com a correção da TJLP [Taxa de Juros de Longo Prazo]”, explica Barros.

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