A segunda instância da Receita Federal já confirmou punições contra réus e empresas ligadas ao processo do mensalão que somam pelo menos R$ 64,4 milhões.
As penalidades foram mantidas pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, órgão do Ministério da Fazenda, e referendam na área administrativa as acusações feitas criminalmente pela Procuradoria-Geral da República na ação no STF (Supremo Tribunal Federal).
Os valores poderão ficar ainda maiores, porque devem ser atualizados pela Receita com base no ano em que os créditos deveriam ter sido pagos à União.
As decisões do conselho apontam que o empresário Marcos Valério de Souza e outros réus do grupo apontado como “núcleo operacional” do esquema cometeram diversas infrações, como evasão de divisas, movimentação de dinheiro de origem não declarada e fraudes contábeis para justificar a entrada e saída de recursos.
Nas empresas dos réus ocorreu o uso de notas fiscais frias e alterações irregulares em livros contábeis, além de empréstimos simulados para justificar movimentações financeiras, segundo as deliberações do conselho.
Os relatórios do órgão do Ministério da Fazenda revelam também que, quando foi descoberto o mensalão, as empresas tentaram alterar sua documentação fiscal para inserir faturamento que não constava de declarações dos anos anteriores.
Segundo documentos da própria Receita, o grupo mandava desde 2002 dinheiro ilegalmente ao exterior, sem passar pelo sistema financeiro nacional.
A Folha analisou 38 processos que já chegaram ao órgão, conhecido como “conselhinho”, que decide sobre os recursos dos contribuintes e da própria Fazenda em divergências na cobrança de tributos. A maior parcela de punições é contra a SMPB, a agência de Marcos Valério indicada como peça chave do mensalão.
Em um dos processos, que resultou em R$ 11,6 milhões em autuações, a Receita acusa Marcos Valério e sua mulher, Renilda Santiago, de agir em “conluio” para “cometer ilícitos” como omissão de receitas, remessas ilegais e “volumosas saídas” de dinheiro para sócios, com a intenção de não pagar tributos. Em outro caso, a autuação contra a SMPB chegou a R$ 27,8 milhões.
Há nos processos cerca de duas dezenas de citações ao mensalão. O relatório da Receita destaca que a SMPB, após o escândalo vir à tona, retificou suas declarações de 2002, ano em que omitiu receitas de prestação de serviços de propaganda e publicidade. A agência, de acordo com a Receita, “só promoveu a retificação de sua escrita e entregou DIPJ [declaração] retificadora em decorrência do intitulado caso ‘mensalão’, o que tornava óbvia a iminência de auditoria pela Fazenda Pública Federal”.
Um dos processos contra Cristiano de Mello Paz, sócio de Marcos Valério, afirma que foi fraudada a contabilidade de outra agência dos réus, a DNA, conforme laudos da Polícia Federal anexados como prova das infrações fiscais.
A própria DNA, segundo dois processos, além das falhas contábeis, distribuiu lucros de R$ 17,5 milhões, valor que seria incompatível com suas atividades. A fiscalização destaca que, em setembro de 2005, após o mensalão se tornar público, a DNA tentou uma “manobra” para legalizar as notas frias.
As decisões do conselho são passíveis de recurso na câmara superior ou na Justiça.
SEM RESPOSTA
O advogado do empresário Marcos Valério e de suas empresas na área fiscal não respondeu aos pedidos de manifestação feitos pela Folha nos últimos dois dias.
O defensor de Marcos Valério na área criminal, Marcelo Leonardo, informou que a defesa do empresário em processos da Receita é feita pelo escritório do advogado Rodolfo de Lima Gropen.
A reportagem ligou para o escritório de Gropen ontem e anteontem, mas a informação foi a de que ele não estava no local. A Folha deixou recados, mas ninguém da banca de advogados telefonou de volta para o jornal.
O advogado de Cristiano Paz na área fiscal não foi localizado pela reportagem até o fechamento desta edição.