Uma empresa, além de todo o ideal empresarial e profissional, traz em seu ambiente uma relação entre pessoas movidas pelas relações de poder e dinheiro. Já uma empresa familiar acrescenta aspectos ligados aos sentimentos que a formam e que são cultivados entre seus membros, o que pode ser muito positivo, mas também carregar em si um potencial destrutivo, como já abordado em outros artigos.
Uma das situações mais corriqueiras e, exatamente por isso, geradoras de problemas é a crença de que a empresa existe para servir à família, às necessidades e aos interesses de seus membros, quando, na realidade, o que sustenta a longevidade desses empreendimentos é exatamente o contrário. Os familiares prestam serviços à empresa familiar e, por consequência, beneficiam-se do seu êxito, tanto no aspecto profissional quanto financeiro.
A instalação de boas práticas de governança corporativa e da profissionalização de sua administração mostra-se decisiva na adequação da estrutura e na preparação e adequação das pessoas que trabalham na empresa, com vistas a criar e manter um ambiente propício à sua sustentabilidade ao longo do tempo.
Esperar que as pessoas ajam por bom senso no papel de sócios, profissionais e familiares ao mesmo tempo, em busca de um benefício comum, é viver uma ilusão de alto risco, por desconsiderar as ambições e agendas pessoais, que sempre irão afetar as relações. Para mitigar esse potencial de problemas, é preciso que se estabeleça o senso comum, que guiará as relações nos diversos ambientes.
Para ter sucesso, a governança corporativa e familiar, bem como os processos de profissionalização da gestão, devem estar amparados e guiados pelo senso de coletividade, ou seja, o que é melhor para a sociedade, para o negócio e para a família. Não para um ou outro.
Entre os sócios, a elaboração e implantação de um acordo societário, que represente os interesses e as expectativas da maioria, é o melhor caminho para pavimentar essa relação, protegendo-a de interesses individuais, privilegiando o grupo.
Da mesma forma, a escolha das pessoas que trabalham na empresa, sendo ou não membro da família empresária, deve ter como base os requisitos técnicos e comportamentais necessários ao papel que irão cumprir. Para tanto, a clareza dos papéis, responsabilidades e desempenho esperado, além de uma remuneração com base na meritocracia, serão decisivos na performance da empresa e na qualidade das relações.
Na família, cultivar os seus valores e manter viva sua história ao longo das gerações são fatos imprescindíveis na formação da consciência social, que deve estar presente nos herdeiros de um empreendimento que gera riqueza para si, para as famílias e para a sociedade com quem convivem.
Luiz Marcatti é sócio da consultoria Mesa Corporate Governance.
Fonte: Exame Notícia publicada quarta-feira, 01 de junho, 2016