Qualquer contribuinte, seja ele pessoa física ou jurídica, pode ter o sigilo bancário quebrado pela Receita Federal sem prévia autorização da Justiça.
Esse não é um procedimento novo, é previsto na Lei Complementar 105, editada em 2001. Mas por ser polêmico, sempre foi questionado nas diferentes instâncias do judiciário.
O espaço para questionamentos, porém, diminuiu muito quando o Supremo Tribunal Federal (STF) bateu o martelo favoravelmente a mais esse superpoder do fisco, em decisão proferida há cerca de um mês.
As consequências do posicionamento do Supremo são amplas, e seus efeitos imediatos.
O advogado Ricardo Miara Schuarts, do escritório Küster Machado, diz que liminares obtidas por contribuintes impedindo a Receita de acessar suas informações bancárias sem aval prévio da Justiça perdem o efeito com a decisão do STF, permitindo que o fisco dê andamento às suas investigações.
Schuarts vai além. Ele diz que há o risco de o fisco usar essa sua vantagem de maneira política. ?A Receita pode mudar a freqüência com a qual quebra o sigilo para tentar aumentar a arrecadação?, diz o advogado.
?É sempre complicado quando muito poder cai nas mãos de um único ente. O judiciário funcionava como uma balança, dando equilíbrio às decisões?, argumenta Schuarts.
Foi esse também o argumento usado pelo ministro Celso de Mello, decano do STF, ao votar contra a Receita. Ele disse que seria necessário um terceiro envolvido (o judiciário) na disputa entre o fisco e o contribuinte.
?Não faz sentido que uma das partes envolvidas diretamente na relação litigiosa seja o órgão competente para solucionar essa litigiosidade?, declarou o ministro ao fundamentar seu voto.
Mas o posicionamento do decano não fez coro no plenário do Supremo. Apenas o ministro Marco Aurélio teve decisão semelhante. Ao final, por nove votos a dois, a Receita recebeu a chancela do STF para ser autônoma no processo de quebra de sigilo bancário dos contribuintes.
No centro desse debate há duas linhas de pensamento definidas. Quem se posiciona contra esse superpoder da Receita evoca o inciso 12 do artigo 5° da Constituição Federal que diz ser inviolável o sigilo de dados. Assim, por mais poderes que o fisco tenha, deveria haver alguma limitação.
Mas o entendimento da maioria dos ministros do Supremo foi o de que a quebra de sigilo não aconteceria. Se daria apenas o translado do sigilo, que passaria dos bancos ? os detentores originais das informações dos contribuintes ? para a Receita. Em outras palavras, o fisco teria capacidade de manter sigilosas as informações fornecidas pelas instituições financeiras.
De fato, a Receita sempre teve acesso a dados financeiros dos contribuintes por meio da extinta Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF).
Com o fim desse tributo formou-se um vácuo de informações, mas que logo foi preenchido com a criação da Declaração de Informação sobre Movimentação Financeira (Dimof).
Por meio da Dimof, os bancos entregam ao fisco mensalmente dados de todos os contribuintes pessoa física com movimentação mensal a partir de R$ 2 mil e de pessoas jurídicas a partir de R$ 6 mil.
Mas se a Dimof já oferece ao fisco acesso aos dados bancários dos contribuintes, por que a quebra de sigilo é tão polêmica? ?Na verdade, se o fisco encontra alguma inconsistência entre a movimentação financeira de um contribuinte informada pelo banco e a renda declarada por ele será feita uma investigação mais aprofundada. Nesse ponto entraria a quebra de sigilo?, diz Schuarts.
O advogado lembra que, embora os poderes da Receita tenham aumentado, o contribuinte não fica totalmente desprotegido. Há um protocolo a ser cumprido antes do sigilo bancário ser quebrado. O fisco é obrigado a notificar de antemão o contribuinte investigado e dar a ele o acesso aos autos da investigação.
Diário do Comércio
Fonte: Portal Contábil SC Notícia publicada quarta-feira, 30 de março, 2016