Acionistas que têm pelo menos 5% das ações da empresa podem pedir, judicialmente, a exibição de livros, registros e documentos da companhia. Basta que apontem atos violadores da lei, do seu estatuto ou que seu pedido esteja fundado em suspeita de irregularidades. Com base no artigo 105 da Lei das Sociedades Anonimas, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul manteve liminar que garante ao empresário Alexandre Grendene Bertele, dono da Grendene, acesso aos documentos que selaram a transferência de um terço das ações da Calçados Beira-Rio, empresa da qual é sócio minoritário, para uma fundação educacional.
No Agravo de Instrumento ajuizado para derrubar a liminar, a Calçados Beira-Rio repetiu o argumento de que sua diretoria tem todo o direito de repassar as ações em tesouraria para a fundação, pois pertencem à sociedade como um todo, e não a um ou outro acionista. Além disso, a cessão foi fruto de deliberação da própria diretoria e teve seu ato registrado na Junta Comercial. Assim, não há razão que justifique uma devassa nos seus livros.
O relator do recurso na 6ª Câmara Cível, desembargador Ney Wiedemann Neto, disse que o desvio das ações da companhia, constatado em relatório de auditoria contábil independente, justifica a ação exibitória de documentos e a liminar. ‘‘Cuida-se de investigação neste processo cautelar e na ação principal, de natureza anulatória, a respeito da prática de atos ilícitos. Trata-se de infração ao disposto no art. 154, § 2º, ‘a’, da Lei 6.404/1976, sendo vedada ao administrador a prática de atos de liberalidade à custa da companhia, no que a doação de ações nos termos em que se realizou pode ser enquadrada’’, disse no acórdão.
Para Wiedemann, a manutenção da medida cautelar vai assegurar o resultado útil da ação principal e, se for o caso, também produzir elementos de prova para eventual investigação pela Receita Federal e pelo Ministério Público, para apurar questões criminais e tributárias correlatas. O acórdão foi lavrado na sessão de julgamento ocorrida no dia 12 de setembro.
O caso Conforme os autos do processo, os administradores da Calçados Beira-Rio S/A, sediada em Novo Hamburgo, cederam cerca de um terço do seu capital social para a Fundação Antonio Meneghetti, presidida pelo próprio acionista controlador, Roberto Argenta. A instituição tem por objetivo social estudar a Ontopsicologia — análise da atividade psíquica do homem.
Como a cessão não respeitou o direito de preferência dos demais acionistas, o empresário do ramo calçadista Alexandre Grendene Bertele, detentor de 12% das ações, protestou contra operação. Pediu acesso a todos os documentos, registros e livros contábeis, a fim de se certificar da lisura do negócio jurídico, o que foi negado por Argenta.
Alijado do processo, Grendene ajuizou Ação Cautelar de Exibição de Documentos. Dado o perigo de alteração, supressão ou acréscimo de registros, o juízo local deferiu liminar para acesso imediato à documentação. Argenta entrou com pedido suspensivo, mas a decisão foi mantida pelo TJ-RS, até o julgamento de mérito do Agravo de Instrumento.