A informação sobre o valor dos impostos terá de ser discriminada nas notas ou nos cupons fiscais de venda e também poderá ser divulgada em painéis dispostos nos estabelecimentos. A nova determinação, prevista em lei aprovada no Congresso, foi sancionada pela presidente Dilma Rousseff. No total, a legislação cita sete tributos que devem ter seu valor informado, seja em termos percentuais, seja em valor nominal, além da contribuição previdenciária e dos impostos incidentes sobre as importações. O texto, contudo, não deixa claro se haverá a obrigação de discriminar o peso de cada tributo individualmente ou apenas apresentar o valor total de tributos federais, estaduais e municipais que incidem sobre o bem. A Receita Federal informou que a lei ainda será regulamentada.
As empresas terão seis meses para se adequar às novas regras. A partir daí, quem descumprir poderá ser enquadrado no Código de Defesa do Consumidor, que prevê multa, suspensão da atividade e até cassação da licença de funcionamento. Diante da necessidade de adequar seus sistemas para emitir os tributos nas notas e cupons fiscais, as empresas aguardam regulamentação do governo, que pode ser feita por meio de decreto presidencial ou instrução normativa, para saber exatamente como os tributos serão divulgados ao consumidor.
Especialistas defendem a divulgação da lista somente em cartazes para minimizar o trabalho nas empresas. “Ainda que seja louvável o intuito, o imposto na nota representa mais burocracia para as empresas”, afirma o advogado tributarista Maucir Fregonesi Junior. Há também quem entenda que o imposto discriminado na nota fiscal mais confunda do que ajude o consumidor. Além de questionar a praticidade da medida, alguns especialistas chamam a atenção para o fato de as empresas terem de se adaptar para lançar as informações na nota fiscal, o que pode encarecer ainda mais o chamado custo-Brasil.
Para o secretário da Fazenda do estado de São Paulo, Andrea Calabi, a divulgação do imposto na nota não é o problema porque as empresas já têm que informar nas guias de recolhimento os tributos pagos aos fiscos federal, estadual e municipal. “O consumidor vai sair do supermercado não mais com uma nota fiscal na mão, mas sim com uma apostila embaixo do braço”, afirma Calabi. “Imagine se em cada item for lançado o imposto pago. Isso não vai ajudar, vai confundir o consumidor.”
O presidente da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), Fernando Yamada, afirma que só será informado o imposto total incidente sobre os produtos. “O brasileiro vai saber quanto paga de imposto e notar certas distorções tributárias. O creme dental, por exemplo, tem um imposto mais alto do que produtos tidos como supérfluos”, alega.
De acordo com a avaliação da Fecomércio-RS, a partir de agora, nesse período de seis meses até a vigência da nova regra, os empresários deverão buscar a melhor forma de aderir à obrigação. “É um passo importante, pois teremos uma maior consciência da população sobre o nosso sistema tributário. Além disso, a nossa percepção é de que vai gerar uma qualificação na gestão tributária das empresas”, avalia o presidente do Sistema Fecomércio-RS, Zildo De Marchi.
O dirigente ainda acredita que possa ocorrer uma parceria entre consumidores e empresários, que terão claras informações sobre o tamanho da carga tributária embutida em cada produto. Entretanto, De Marchi considera que alguns pontos serão mais complexos nesse início de procedimento, como o cálculo aproximado de cada tributo em cada um dos produtos e serviços, e ainda a questão da substituição tributária, que não terá seu valor aparecendo na nota fiscal, uma vez que o varejista já compra o produto com o imposto pago pela indústria.
Discriminação de taxas é lei nos Estados Unidos e praxe no Reino Unido
A exigência de discriminação dos impostos pagos na nota fiscal varia em outros países. Nos EUA, o único discriminado é o imposto sobre consumo de mercadorias e serviços, o VAT (imposto de valor agregado, espécie de ICMS). Os valores dos impostos aparecem discriminados apenas em recibos – nunca em embalagens, menus ou anúncios que informem o preço do produto.
Os impostos sobre produção, importação, propriedade e tarifas trabalhistas, porém, já estão agregados no custo final e não são discriminados na nota fiscal. No Reino Unido, as notas fiscais de serviços e produtos também discriminam o valor pago relativo ao VAT. Para compras de até 250 libras, é possível que os estabelecimentos façam uma nota fiscal simplificada.
A nota mostra o preço do que o consumidor adquiriu, o quanto paga de impostos e o preço final. A legislação não obriga os estabelecimentos a emitir nota fiscal ou recibo com o valor dos impostos, a não ser que o cliente peça, mas é praxe recebê-los em todas as transações. Isso porque os vendedores estão sujeitos a multas caso descumpram o pedido de um cliente.
Na China, os tributos não aparecem na embalagem dos produtos nem nas notas fiscais, que vêm carimbadas com o selo oficial da empresa emitido pelo governo. A peculiaridade das notas é que, em várias regiões, há uma “raspadinha” semelhante à de bilhetes de loteria. A ideia é distribuir pequenos prêmios em dinheiro para incentivar os consumidores a solicitar o comprovante.
Determinação do governo federal divide opiniões
A discriminação dos impostos na nota foi uma decisão comemorada por grande parte das entidades ligadas ao setor varejista e da área tributária. O presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), João Eloi Olenike, lembra que esta é uma das bandeiras de lutas do instituto há 20 anos. “Ela coloca o Brasil no mesmo patamar de países desenvolvidos em relação à transparência tributária”, diz.
“Com a aplicação desta lei, o Brasil dá um grande passo em direção ao respeito ao cidadão”, comenta o presidente do IBPT, acrescentando que, “ao conhecer os tributos que incidem sobre produtos e serviços, o brasileiro terá condições de exigir melhor retorno dos valores arrecadados pelos cofres públicos, com serviços de qualidade em benefício de toda a população”.
A Associação Comercial de São Paulo criou, há mais de um ano, um software para computar os impostos na nota. Até fevereiro, vai fornecê-lo gratuitamente para os demais estados. Para o economista Bernard Appy, sócio da LCA Consultores e ex-secretário-executivo do Ministério da Fazenda, a novidade é “aumento de custo-Brasil na veia”. “Em um momento em que se discute a necessidade de simplificação tributária, me surpreende que criem mais uma obrigação”, afirma. “A transparência é boa, mas desse jeito, o custo é maior do que o benefício.”
A publicidade de impostos não pode ser paliativo para postergar reforma tributária, diz a Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL). A CNDL e o Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) aprovam a publicação com ressalva. Na avaliação das entidades, a iniciativa de informar o imposto à sociedade com transparência é um marco na legislação brasileira e, sobretudo, um direito do consumidor. No entanto, a medida esbarra em problemas operacionais, em especial para as pequenas e médias empresas. Além disso, a lei não pode ser uma medida paliativa para adiar uma reforma tributária.
Na avaliação da CNDL, os vetos reduziram em parte a dificuldade de execução da lei, mas o pequeno comerciante, que atualmente constitui a maior parte do varejo brasileiro, ainda terá um custo adicional para informatizar e adequar a própria estrutura em um espaço de tempo muito curto.
Para o advogado Flavio Antunes, sócio da Flavio Antunes Sociedade de Advogados, a nova determinação vem com 24 anos de atraso. “A Constituição Federal de 1988, no seu artigo 150, item 5º, foi quem determinou que os consumidores fossem informados acerca dos impostos que incidiriam sobre mercadorias e serviços, mas isto até agora não vinha se aplicando, ante a ausência de lei nesse sentido, por manifesta falta de interesse dos entes políticos tributantes, com o intuito de esconder a carga tributária real das mercadorias e serviços”, afirma o especialista.
Dúvidas sobre a lei aprovada
O que prevê a lei?
Valores ou percentuais de impostos embutidos no preço final de produtos e serviços devem ser listados nas notas ou cupons fiscais. Complementarmente, os estabelecimentos também podem fixar painéis com a relação.
Por que o IR e a CSLL foram excluídos da lista?
Ambos são tributos atrelados ao balanço anual das empresas e, portanto, não é possível calcular sua incidência sobre cada produto.
Quando a regra começa a valer?
A partir de junho de 2013. A lei estabelece o prazo de seis meses para as empresas se adequarem.
Como será a nova nota fiscal?
A lei sancionada não detalha como as informações deverão ser divulgadas. Empresas esperam regulamentação por meio de decreto presidencial ou instrução normativa explicando de que forma que os tributos devem ser listados.
O que acontece com quem descumprir?
Pode ser enquadrado no Código de Defesa do Consumidor, que prevê sanções como multa, suspensão da atividade e até cassação da licença de funcionamento.